Outra coisinha...

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segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

A Carta - "A Sombra no Espelho!














Uma pequena semente dos infernos,
plantada bem na medula óssea,
questão de tempo para me deixar paralítico.
Porque eu?
Acho que seu Deus não me ama... Ninguém!
Não tenho mais forças para nada,
nem motivos para viver,
sinceramente já pensei em até me matar,
quem sabe assim encontro meu lugar,
lugar de ninguém,
o lugar de todos!
Sinto um vazio imenso no peito
junto de uma dor alucinante em minha costa,
talvez seja apenas um mal estar no corpo
ou uma preguiça absurda,
não sei ao certo...
Umas cutucadas que chegam a latejar a cabeça
dando-me náuseas.
Um dia antes de receber sua carta
estive em maus lençóis,
não conseguia pensar em nada
nem em ninguém,
muito menos em mim,
eu queria somente a morte... Somente!
Eu tenho feito à sessão de quimioterapia,
porque os médicos creditam em minha recuperação,
só porque eles acreditam, eu não!
Após uma sequência de medicamentos pela manhã,
me deitei,
o sono foi tão pesado
no qual acordei somente às dez da noite.
“Corpo mole, mente vaga, sonolência dominante. Uma perna pra fora da cama sendo seguida pela outra, arrastando-se pelo lençol manchado de comidas, remédios, sangue... As pálpebras estão pesadas, mal consigo manter os olhos abertos, um cochilo ligeiro... Será que a morte me visitará dessa forma? Lenta, passional e sem dor? Duvido muito!”
Com um pouco de dificuldade vou até o banheiro,
cheio de náuseas e pisando duro,
todo desajeitado,
nem quando eu bebia me sentia assim,
vai ver que ela me fazia bem...
Que vontade de uma dose bem servida!
Só de pensar eu vomito...
Já nem tem mais cor,
já não sai quase nada.
Sinto a garganta queimar,
calafrios constantes,
tendo que medir minha temperatura
quase o tempo todo... Novamente ânsia!
Não aguento mais!
Estou com um odor azedo
devido a essa cena deprimente,
a mais de vinte horas sem tomar banho,
a enfermeira até tentou me ajudar,
mas eu a insultei com palavrões de A a Z,
fazendo-a chorar e ir embora...
Somente eu e o frigobar,
vazio... Parecido comigo!
 “Luxo total, o banheiro é imenso! Ao lado do frigobar a enorme banheira de centro, cabendo confortavelmente quatro pessoas. Uma tela de cinema com um áudio perfeitamente distribuído. As paredes todas de espelho com colunas de madeira. As claridades das luzes davam para serem ajustadas com um pequeno controle no tom chumbo, a mesma cor da pia e do sanitário, esse com o estofado na cor preta. Era praticamente uma sala de banho, não economizou dinheiro, sempre prometeu para si mesmo que teria a casa a seu modo!"
Nada para beber,
nem um gole de álcool,
nem posso,
nem devo... Como eu quero!
A água esta morna,
sem espumas, sem sais minerais,
sem frescura nenhuma,
apenas agua e meu corpo trêmulo.
Por que eu?
Um tumor, por que eu?
Um mergulho com o corpo todo submerso,
apenas o nariz e boca para fora d’água,
afogando minhas duvidas,
as vozes em minha mente...
O pensamento em suicídio é intenso!
Ouço as batidas de meu coração,
e lembro-me da cena,
dela deitada sobe meu peito
dizendo que meu coração batia forte:
“Sente o meu agora, sentiu? Está calmo, né?! Culpa sua! Você me deixa assim, você é minha fonte de calmaria, meu oceano dos segredos obscuros e desejos insanos, meu verdadeiro eu, com você eu não preciso encenar, eu apenas respiro ao seu lado e inspiro as minhas verdades, as minhas vontades, você...”
Não a deixei terminar,
precisava daquele beijo,
porque meu coração chorava
ao ouvir aquelas palavras,
caindo aos pedaços
e se transformando em migalhas,
porque poucas horas antes eu estava
com a outra... Uma das outras!
Eu sou culpado por tudo,
por toda essa tristeza,
por toda essa minha solidão,
nunca consegui por mais de uma hora
ser sincero com ela,
contar as verdades
e dizer o quanto eu amava-a... Nunca liguei pra isso!
O mergulho me fez lembra-la,
então, submergi e vi a minha realidade,
cabelos espalhados pela água...
Levei minhas mãos na nuca,
e um simples passar de mãos
os cabelos se soltaram,
por um momento fiquei ofegante,
mas logo lembrei que era o efeito das drogas
que tenho tomado para retardar meu problema.
Sai de dentro do meu desespero,
e parei de frente com aquela sombra
refletindo a escuridão, tristeza, dor...
Meu reflexo!
Perdi muito peso,
e o espelho não deixava-me iludir
com a possível recuperação.
O que antes era meu maior charme
agora estava entregando-me a angústia.
Me aproximei a um palmo da parede de vidro,
e eu vi... Vi uma sombra...
Não era minha!
“Você... Suicida, logo estaremos juntos!”
Não é a primeira vez que ouço vozes,
mas dessa vez era diferente,
eu estava vendo,
tremendo pela febre, de medo.
Engoli seco...
Meus lábios roxos trêmulos tomaram uma iniciativa,
consegui me defender:
“ Não sou suicida, estou com um câncer!”

Fui surpreendido com uma resposta que gelou toda a espinha.
 “Sim, você morreu há muito tempo! Após ela morrer, você sabe quem, não conseguiu mais se olhar para o espelho, o que não é pra menos, foi ai que começou sua morte... Parcelada! Aos poucos, você foi entrando no mundo da ilusão, da perdição, drogas, bebidas, mulheres... Aos poucos você foi provocando isso, e o câncer... É apenas seu castigo que lhe concedi, uma morte lenta e dolorosa, na qual você terá tempo em pensar nas suas escolhas, nos suas maldades e falsidades. Esse não é fim, você ainda irá experimentar a dor da dependência, a mesma dor que sua mãe passou, do mesmo jeito que não ajudou-a...”
 “Cala a boca”
 “Como você é fútil, egoísta e ridículo! Não ajudou a própria mãe quando necessitou, simplesmente a deixou morrer. Que tipo de filho você é? Ou melhor, que tipo de monstro você esconde? Não é melhor que os demônios que irá encontrar, não é melhor que um assassino, você é uma alma vazia... Assassino!”
Aquela sombra diante do espelho,
sabia de tudo,
da pessoa ridícula que sou
e dos meus erros para alcançar a riqueza.
Riqueza...
 “A vida não necessita só de dinheiro e bens, o tudo agora é nada, e o nada são meus pensamentos e as lembranças me sufocando.”
 Após ouvir tudo calado, tive o desprazer de uma última frase:
 “Até mais!”
Minha perna esquerda amoleceu
feito casca de banana descascada,
me fazendo desabar no chão
batendo com a cabeça no espelho...
Ouvi um zumbido...
Cacos caindo sobre mim
estridentes no piso molhado...
Um corte na testa
e um sangue escorrido misturado com a água.
Não conseguia movimentar a perna,
a mão esquerda estava dormente,
junto de um formigamento...
A doença... Meu castigo?
Um trovão estremeceu tudo,
um temporal do lado de fora
um silêncio dentro de mim.
O céu estava negro
parecido com o meu banheiro,
molhado e cinzento.
Estou morrendo...
Um pensamento,
a resposta para minha própria pergunta
veio à cabeça em três palavras:

“Culpado, egoísta e Assassino”
Sim eu sou culpado,
e me arrastando até chegar ao quarto.
No dia seguinte fui socorrido
pela aquela que insultei e expulsei de minha casa,
a enfermeira Bianca.

PS: Tem certeza que ainda quer um assassino como padrinho da sua filha? Eu desejo muito ser o padrinho, por isso te contei a verdade!

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